MONTEIRO, Maurílio de Abreu. Apropriação de terras públicas e quimificação da produção no agrário amazônico: o caso da região de Carajás. In: Encontro Nacional de Economia Política, 29., 2024, Marabá. Anais [...]. Niterói: Sociedade Brasileira de Economia Política, 2024. p. 1-25.
O texto discute a conformação do agrário da região de Carajás, situada na Amazônia, ela apresenta uma economia agrária marcada por sua diversidade ecológica, histórica e social. Desde a segunda metade do século XX, observam-se conflitos e tensões relacionados à posse da terra, modos de produção e impacto ambiental. Este texto explora as rápidas mudanças nessa economia, destacando as relações entre agentes econômicos, instituições e usos da terra, assim como os impactos ambientais e as perspectivas de sustentabilidade regional.
As mudanças na economia agrária da região estão ligadas à apropriação de terras públicas e ao aumento do uso de insumos químicos, refletindo transformações estruturais profundas. A produção agrária é heterogênea e inclui dois principais tipos de agentes: produção camponesa, baseada no trabalho familiar, priorizando consumo e investimento familiar, e produção patronal, fundamentada no trabalho assalariado e orientada pela eficiência do capital e pela taxa de retorno. Entre 1996 e 2017, o valor bruto da produção agropecuária (VBP) cresceu substancialmente. Contudo, enquanto a produção patronal registrou um crescimento acelerado, a produção camponesa perdeu representatividade relativa.
A produção patronal destaca-se pela pecuária bovina, que representa a maior parte do VBP patronal, com forte especialização na produção de carne e leite, pela produção de grãos como soja e milho, intensamente dependentes de insumos químicos, e pela apropriação de terras, com destaque para municípios como São Félix do Xingu. Por outro lado, a produção camponesa, embora ainda relevante, enfrentou desafios. A pecuária bovina familiar aumentou sua especialização, mas manteve uma participação estável no número de pessoas ocupadas. As culturas temporárias, como mandioca e abacaxi, enfrentam limitações de produtividade, enquanto as culturas permanentes, focadas no cacau, mostram maior potencial de sustentabilidade ecológica, mas sofreram retração na área cultivada.
As políticas públicas favoreceram desproporcionalmente a produção patronal, refletido em maior acesso ao crédito, suporte financeiro e técnico para grandes produtores e ampliação do estoque patronal por meio da privatização de terras públicas. As transformações no uso da terra geraram impactos ambientais significativos, como a redução de florestas para dar lugar a pastagens e monoculturas e a quimificação da produção, com uso intensivo de agrotóxicos e adubos.
A pecuária bovina se consolidou como a principal atividade, enquanto a produção de grãos emergiu como uma nova trajetória. A elevada intensidade química dessas produções, contudo, aumenta a dependência de insumos extrarregionais. As trajetórias camponesas mantêm diversidade, mas enfrentam desafios de produtividade e sustentabilidade. A maior dependência de insumos químicos indica dificuldades em incorporar práticas mais sustentáveis.
Entre 1996 e 2017, a expansão da economia agrária de Carajás foi sustentada pela consolidação da pecuária bovina e pela expansão de culturas temporárias em bases patronais. Essas mudanças foram facilitadas por políticas institucionais que permitiram a apropriação de terras públicas e pela intensificação do uso de insumos químicos. Embora o crescimento econômico tenha sido expressivo, ele ocorreu frequentemente à custa de maiores desigualdades sociais e impactos ambientais. A dependência de insumos químicos e mecânicos reflete uma inércia produtiva, em que novas estratégias mais sustentáveis permanecem pouco exploradas. A região enfrenta o desafio de equilibrar crescimento econômico com práticas que promovam a sustentabilidade e a equidade social.